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Foto do escritorGeorges Humbert

A remoção de barracas de praia pode violar o meio ambiente e a Constituição

Algumas cidades litorâneas, a exemplo de Salvador, vivem uma celeuma sobre o destino das suas barracas de praia.


Neste município tudo começou com o projeto de requalificação proposto pela prefeitura, seguido do embargo da obra pelo IBAMA, propositura de ação judicial pela procuradoria da república, culminando com a decisão da justiça federal que determinou a remoção de todas as barracas, já executadas na sua totalidade em abril de 2011.


Estes atos, assim como outros semelhantes que venham a ser levados a efeito, ofendem o meio ambiente e direitos constitucionais fundamentais.


Remoção de barracas de praia e o meio ambiente

De início é preciso esclarecer que meio ambiente não é só o que está na natureza.


Meio ambiente compõe-se por tudo que integra o nosso habitat, incluindo as construções do homem, sua presença e tudo aquilo que faz parte das suas tradições. Tratam-se dos denominados meio ambiente artificial e cultural, também protegidos constitucionalmente. Ademais, todo o cidadão tem direito de exercer atividade econômica, de trabalhar e de ter atos do poder públicos confiáveis (C.F. arts. 5°, 6° e 170).



Contudo, os atos de todos os agentes públicos envolvidos em casos como os das barracas de praia da primeira capital do país olvidaram essas importantes questões e malversaram princípios e regras constitucionais.


Decisão sobre a remoção das barracas de praia

O primeiro a descartá-las foi o Poder Público, no nível Municipal e da União, este por intermédio de sua administração indireta autárquica, leia-se, o IBAMA.


O primeiro detinha competência na matéria, respectivamente, para ordenar os espaços urbanos, promovendo as funções sociais da cidade, princípio do art. 182 da Carta Magna e que inclui, entre outros, os deveres de gerar trabalho e lazer para os citadinos. e para ordenar o uso racional, ambientalmente adequado de suas áreas. Não se entenderam.


O segundo a maltratar referidas normas foi a Procuradoria da República que ingressou com uma ação buscando apenas a tutela do meio ambiente natural, sem se lembrar que as barracas de praia fazem parte da cultura do país e estão presentes, à longa data, em toda sua extensão litorânea, integrando o seu meio ambiente.


Finalmente, o judiciário acatou o pedido e, sem impor qualquer determinação quanto ao destino econômico e social dos barraqueiros, impôs uma não planejada e, por todas as razões jurídicas apontadas alhures, ilegal demolição, em detrimento da adequada ordenação e uso sustentável da área em conflito.


Tradição e cultura das barracas de praia

A permanência das barracas de praia, como fato integrante da tradição, da cultura e do direito ao lazer em algumas regiões do país, é o mais correto, do ponto de vista jurídico e social.


Todavia, deve ser realizada mediante do devido processo legal e observadas as condicionantes ambientais, urbanísticas, bem como rigoroso plano de gestão das áreas que permita o seu uso múltiplo e compatível com a sustentabilidade das nossas preciosas praias.


Somente assim, aqueles que não atenderem estas exigências deverão, após exercerem o amplo direito de defesa, ter sua barraca demolida; seqüencialmente, como condição de validade da demolição, encaminhados a um programa de reinserção profissional, numa operação conjunta entre o Município, Estado e União.



Valorizar-se-á, desta forma, o meio ambiente como um todo, em seu aspecto natural e cultural, além dos direitos socioeconômicos ínsito a todo o cidadão brasileiro.


Diante do exposto, forçoso concluir que os cidadãos soteropolitanos e os barraqueiros tiveram desrespeitados direitos intangíveis: meio ambiente ecologicamente equilibrado, trabalho e segurança.


A uma porque o ambiente, notadamente o conteúdo cultural, estará desprotegido com a indiscriminada, não planejada demolição e as suas inevitáveis conseqüências - uma delas pode ser a reocupação desordenada dos espaços litorâneos ou sua favelização.


Em segundo lugar porque muitos perderão seu emprego e renda. Finalmente, porque as praias, a despeito de serem bens públicos, não são intocáveis, devendo ser aproveitadas de forma ordenada, adequada e racional, preservando e resolvendo corretamente a equação da sustentabilidade composta pela responsabilidade social, econômica e ambiental.


E os barraqueiros de Salvador? Bem, com a recente execução das demolições, entraram para história como os únicos, entre os milhares de ocupantes do nosso vasto litoral barraqueiros ou não, que deixarão de exercer uma atividade econômica lícita, vitimadas, exclusivamente, pela falta de razoabilidade, planejamento e da reentrante insegurança jurídica que norteia os atos do Poder Público.


Tudo isto, é claro, em confronto com o princípio da dignidade da pessoa humana e do ditame do bem estar social, alicerces da Constituição.

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